segunda-feira, 28 de setembro de 2015

não perdoo

não perdoo, não perdoarei nunca, nem tenho que perdoar, que o PàF tenha cortado a minha pensão de aposentadoria e a de outros como eu, que toda a vida trabalhámos para a conseguir, descontando parte substancial do salário mensal. 
não perdoo que tenham cortado salários e aumentado as horas de trabalho aos funcionários públicos, assim, sem mais nem menos. 
não perdoo que, ao menos, não tivessem a decência de cortar proporcionalmente as pensões de reforma, ou outras, e de cortar proporcionalmente os salários e aumentado as horas de trabalho dos diretores e subdiretores de todas as diretorias e subdiretorias, dos CEO, presidentes, vicepresidentes e vicevicepresidentes dos mais que muitos tachos e prebendas. 
não perdoo que atirem as culpas só para cima de uns, quando tiveram tanta ou mais responsabilidade naquilo que aconteceu às finanças. 
não perdoo que tenham subido astronomicamente os impostos de quem os paga e não tenham feito nada para cobrar os impostos de quem, tendo muito mais que os pagar, os não paga. de quem foge a eles como o diabo da cruz. de quem vai pagá-los no estrangeiro, por metade do preço.
não perdoo que, ao menos em troca, não tenham baixado a dívida pública, não tenham criado empregos e tenham mandado meio mundo para fora, como refugiados de um país idiota. 
não perdoo a falta de sentido de Estado com que destruiram a função pública, as empresas públicas, os setores essenciais da economia nacional. não perdoo a forma como vendilharam tudo, e mais que houvesse, por tuta e meia. 
não perdoo muitas mais coisas, que nem sequer vale a pena aqui referir. 
não voto neles. e tudo farei para que ninguém caia no inacreditável disparate de votar em semelhante gente.

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

o Califado

a Europa, mas sobretudo os Estados Unidos, entendem o Estado Islâmico à maneira ocidental: a gente corta-lhes meia dúzia das principais cabeças à dronada e já está: era uma vez o Estado Islâmico. 
mas o Estado Islâmico, perdão, o Califado, é mais que meia dúzia de cabeças políticas e um milhão de seguidores acéfalos. 
é um estado de espírito, 
é um mundo novo. 
pode ser uma aberração, mas é isso que ele é: um mundo novo. 
e contra mundos novos não há drones que funcionem. 
dificilmente, senão nunca, conseguiremos vencer uma coisa que não compreendemos. 
diz um amigo meu que "cada alforreca que se corta em bocados, de cada um destes resulta uma nova alforreca". 
concordo. e, sendo alforrecas inteligentes e estudadas, pior ainda.

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

os migrantes

somos uma cambada. 
há milhares de migrantes que morrem há meses nas ondas do mar Mediterrâneo. há milhares deles que morrem de fome, de sede e de cansaço desde o início das movimentações migratórias rumo à Europa. mas só agora está todo o mundo incomodado por causa do "Menino da Praia". 
um dia destes esquecem-se do "Menino da Praia", vem outra coisa mais chocante (um gato morto, um cachorro morto?) e pronto, lá fazemos de conta que nos incomodamos outra vez.
a situação é grave e não dá sinais de melhorar, de diminuir de gravidade, sequer. 
é preciso resolver os problemas das crianças, dos gatos, dos cães e também dos homens e mulheres adultos - que são afinal os que migram em primeira linha. 
é preciso compreendermos em que é que estamos metidos e por que razão nos meteram nesta situação, a nós, que os vamos receber, e a eles que querem ser recebidos. 
é preciso que quem os lançou na miséria e na debandada assuma a sua responsabilidade histórica. 
é preciso parar com a hipocrisia dos que atacam os traficantes de vidas humanas, como se não houvesse migração sem eles, como se por detrás da migração não estivessem os disparates bélicos "ocidentais" e os interesses inconfessáveis por detrás deles, como se, por último, os Estados estivessem preparados logisticamente para transportar e receber com dignidade todos os que querem vir. 
é preciso, sim, pôr fim aos traficantes, mas é preciso também - e, se calhar, primeiro - pôr fim áquilo que leva as pessoas a recorrer a eles. 
é preciso pôr fim às causas para poder pôr fim às consequências. 
é preciso agir com sabedoria e tino. antes que as novas hordas de migração deem cabo dos ovos de ouro que procuram nesta galinha europeia.

isto já aconteceu uma vez na história da Europa. era o Império Romano e algum tempo depois deixou de ser.